
A dor e o sofrimento provocam mudanças no psiquismo daquele por eles atingido e o coloca em uma situação de humilhação. É como se ele se sentisse abatido, vencido diante da vida. Daí a necessidade de acompanhamento terapêutico para ajudá-lo a aprender a lidar com essa nova situação e acomodar a perda como experiência de vida.
Aos poucos, perde-se a vergonha de sentir dor psíquica, ao perceber que a dor só diminui e inspira, depois de ser acolhida, vivida, “pensada” e atravessada. As dores e perdas não são propriamente solucionadas, mas podem ser atravessadas de maneiras mais criativas e inteligentes. A dor da perda deixa de ser vista, experimentada como castigo, e passa a ser uma oportunidade de estar mais vivo, em um contato muito mais vibrante com o mundo físico e social. Trata-se de um percurso lento, que ensina a entrar nos processos temporais e a conhecer a duração, a espera. Muitas “fichas” só caem depois, um pouco mais tarde, quando houver tempo de realizar a ligação entre o que se viveu e um mundo de memórias, palavras, estímulos e sensações passadas e presentes. É preciso sonhar a perda, a morte e a situação de solidão. A realidade nua e crua da morte é muito brutal, não conduzindo a nada. É preciso fazê-la entrar em um campo de sentidos para que ela se torne aceitável. A ansiedade arcaica em bruto é uma quantidade avassaladora de afeto sem rosto e sem nome, monstruosa. Ao sonhá-la, ela entra em conexão com palavras, brincadeiras, torna-se a ansiedade secundária, mais suave e suportável.
Aprende-se, então, a esperar para ver como vão ficar as coisas, o desespero diminui, e surge um tipo de esperança meio fraca, ainda acompanhada de um certo desamparo. O sentimento de ser frágil, vulnerável, não vai embora, ele obriga a descobrir um jeito de dar valor positivo à fragilidade humana, associando-a a algum ganho, tornando a pessoa mais sensível e humana. Isso tudo é o que comumente chamamos de “atravessar um luto”, é perder para ganhar em delicadeza, insight, novas formas de sentir prazer e fazer contatos.
Parece elementar, mas dificilmente consegue-se atravessar tudo isso sozinho; o processo exige a companhia de alguém que suporte a travessia sem atrapalhar muito, sem ficar muito ansioso e apressado. O luto é um procedimento comum, parecido com a digestão biológica, existe para “DEIXAR PASSAR O PASSADO" PARA ABRIR O FUTURO. Entretanto, apesar de ser tão básico, mobiliza um montante tão insuportável de afetos que é algo do qual tentamos fugir através de todas as maneiras possíveis e imagináveis. Fugindo dele, perde-se o contato com o mundo e mergulha-se na depressão, nos estados maníaco-depressivos e na melancolia. Quem não sente a dor e não realiza o luto de suas expectativas onipotentes infantis e magalomaníacas, entra em depressão, no sentido patológico. Muitas vezes, confunde-se essa depressão melancólica com uma boa e salutar capacidade de tristeza: é preciso poder entristecer-se diante do que na vida vai sendo perdido, vai ficando para trás, mas sem o que a vida estanca e se repete, sem que nada de novo possa surgir pela frente. A “posição depressiva”, desde que bem atravessada, dá lugar à capacidade de entristecer-se sem se desesperar.
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