domingo, 12 de outubro de 2014

O TERCEIRO ATO -

Uma das maiores mudanças , a que podemos chamar de revolução, no último século, foi a da longevidade. Nenhuma foi tão significativa como a possibilidade de viver mais. Hoje se vive muito mais do que se vivia no século passado. Estamos vivendo em média, hoje, 34 anos a mais do que nossos bisavós. Isso significa viver um completo segundo período de vida adulta que foi acrescentado à nossa expectativa de vida. Apesar disso, ainda continuamos vivendo sob a influência da antiga visão de que a vida tem sua curva de ascendência e, depois dos trinta anos, a curva da decadência, submissos à lei da entropia, segundo a qual tudo e todos estão fadados ao desgaste e a desaparecer. Em outras palavras, você nasce, atinge o auge na meia-idade e declina para a decrepitude. Idade como patologia, como doença. Filósofos, artistas, médicos, cientistas e muitas outras pessoas estão, hoje, lançando um novo olhar para o que podemos chamar de terceiro ato, ou seja, as três últimas décadas da vida. Essas pessoas percebem que esse período é, na verdade, um estágio de desenvolvimento da vida com sua própria significância – tão diferente da idade madura quanto a adolescência é da infância. E estão questionando, e todos nós deveríamos estar questionando, como usamos esse tempo a mais. Qual a melhor maneira de vivê-lo plenamente? Qual o novo significado para o envelhecimento hoje? A ciência já pesquisou sobre este assunto e fez novas descobertas. Descobriu-se, por exemplo, que a imagem mais adequada para representar o envelhecimento é uma escadaria – a ascensão para o topo do espírito humano, trazendo-nos sabedoria, completude e autenticidade. De forma nenhuma idade como doença; idade como potencial. E esse potencial não é para poucos felizardos. Hoje a maioria das pessoas acima de 50 anos sente-se melhor, é menos estressada, é menos hostil, menos ansiosa. Tendemos a ver o que temos em comum mais que as diferenças. Alguns estudos dizem até mesmo que somos mais felizes. Isso não é o que se esperava, acreditem. Muitos de nós vêm de uma longa linhagem, ou descendência, de antepassados depressivos. Antigamente, quando alguns se aproximavam dos seus 40 anos, assim que acordavam de manhã, seus seis primeiros pensamentos eram todos negativos. Era mesmo de assustar. Assim, alguém pensava: “puxa vida, vou me tornar uma velhota, ou um velhote, mal-humorada.” Mas, agora que muitos estão, de fato, precisamente no meio de seu terceiro ato, percebem que nunca foram tão felizes. Essas pessoas têm uma tremenda sensação de bem-estar. E elas descobriram que, quando se está dentro da velhice, em vez de olhar para ela do lado de fora, deve-se olhar o que foi construído por dentro, e aí o medo se aquieta. Você notará que ainda é você mesmo, ou talvez até mais. O pintor espanhol, Pablo Picasso, disse uma vez que “se leva um longo tempo para se tornar jovem”. Não pretendo tornar a velhice romântica. Obviamente, não há garantia de que a velhice seja um tempo de fruição e crescimento. Alguma coisa disso é uma questão de sorte. Alguma coisa disso é, obviamente, genético. Um disso, de fato, é genético. E não há muito que possamos fazer sobre isso. Mas isso significa que, para dois terços de quão bem desempenhamos no terceiro ato, podemos fazer algo. Não esqueçamos também que para se chegar ao terceiro ato, há que renunciar a certas coisas e fazer melhores escolhas. Vamos examinar o que podemos fazer para tornar esses anos adicionais realmente bem sucedidos e usá-los para fazer a diferença. O mundo inteiro opera com uma lei universal: a entropia, a segunda lei da termodinâmica. Entropia significa que tudo no mundo está num estado de declínio e decadência. Há apenas uma exceção a essa lei universal e isso é o espírito humano, que pode evoluir em direção ao topo, trazendo-nos para completude, autenticidade e sabedoria. Precisamos compreender definitivamente que nós não temos espírito. Nós todos nós somos espíritos. Muitas vezes, o espírito que somos fica soterrado debaixo de desafios da vida, violência, abuso, negligência. Talvez nossos pais sofressem de depressão sem que o soubessem. Talvez eles não fossem capazes de nos amar além daquilo que tentaram. Talvez ainda soframos com uma dor psíquica, uma ferida, que trouxemos e ainda não foi cicatrizada. Talvez experimentemos a sensação de que muitos de nossos relacionamentos não tiveram uma conclusão. Amores inacabados; amores que precisavam ter sido de todo vivenciados. Daí nos sentirmos inacabados, em falta com a vida. Esse pode ser o exercício do terceiro ato: terminar a tarefa de encerrar a nós mesmos. Imaginemos que nossa vida é como uma peça de teatro, uma peça que não admite ensaio. Essa peça é dividida em três atos com duração de trinta anos cada um deles, se vivermos noventa anos. Para alguns, a tarefa de encerrar a si mesmos começou quando se aproximavam do seu terceiro ato, no seu aniversário de 60 anos. Como é para se viver? O que tem para realizarmos nesse ato final? Para que saibamos para onde estamos indo, precisamos saber onde estivemos. Então, as pessoas que conseguirem chegar ao terceiro ato precisam voltar e analisar seus dois primeiros atos, tentando ver quem elas eram na época, quem elas realmente eram – não quem seus pais ou outras pessoas lhe disseram que eram, ou lhes trataram como se elas fossem. Mas quem elas realmente eram. Quem foram seus pais – não como pais, mas como pessoas. Quem foram seus avós e como eles trataram seus pais. Aí está a sua história. Isso é o se chama pelos profissionais da Psicologia de análise da vida. Ela pode dar nova significância, clareza e sentido à vida de uma pessoa. Através desse processo de análise, você pode descobrir, como essas pessoas fizeram e chegará à conclusão de que muitas coisas que você costumava pensar que eram falha sua, muitas coisas que costumava pensar sobre você mesma, na verdade, não tinham nada a ver com você. Não era falha sua; tudo era consequência da forma de agir daqueles que o antecederam. E assim poderá se libertar de seu passado. Você poderá mudar sua relação com seu passado. Tudo na vida pode ser tirado de você, exceto uma coisa, sua liberdade de escolher como você responderá a uma situação. Isso é o que determina a qualidade de vida que vivemos, e qualidade de vida aqui não significa se somos ricos ou pobres, famosos ou anônimos, saudáveis ou doentes. O que determina nossa qualidade de vida é como nos relacionamos com essas realidades, que tipo de significado atribuímos a elas, que tipo de atitude mantemos sobre elas, que estado mental permitimos que elas provoquem. Talvez o objetivo principal do terceiro ato, para aqueles que chegarão a ele, seja voltar e tentar, se apropriado, mudar nossa relação com o passado. Acontece que estudos cognitivos demonstram que, quando somos capazes de proceder assim, isso se manifesta neurologicamente – caminhos neurais são criados no cérebro. Precisamos avaliar se, ao longo do tempo, reagimos negativamente a acontecimentos passados e a pessoas, caminhos neurais são configurados por sinais químicos e elétricos que são enviados através do cérebro. E, com o tempo, esses caminhos se estabelecem, eles se transformam na norma – mesmo se são ruins para nós porque nos causam estresse e ansiedade. Contudo, se pudermos voltar e alterar nossa relação, reavaliar nosso relacionamento com pessoas e eventos do passado, os caminhos neurais podem mudar. E se pudermos manter sentimentos mais positivos sobre o passado, isso se torna o novo modelo. É como reajustar o termostato. Não é ter experiências que nos torna sábios, mas é refletir sobre as experiências que tivemos que nos faz sábios – e que nos ajuda a ser completos. É isso que nos traz sabedoria e autenticidade. Isto ajuda a nos tornar o que poderíamos ter sido. Lembremos que somos os sujeitos de nossas próprias vidas. Mas muito frequentemente muitos, se não a maioria de nós, quando alcançamos a puberdade, a época em que entramos na adolescência, começamos a nos preocupar em ajustar-nos e sermos populares. E nos tornamos os sujeitos e objetos da vida de outras pessoas. Agora, em nosso terceiro ato, talvez seja possível para nós percorrer de volta o círculo até onde começamos e conhecê-lo pela primeira vez. E se pudermos fazer isso, não será apenas para nós mesmos. Atualmente, pessoas mais velhas são o maior contingente demográfico no mundo. Se pudermos voltar e redefinir a nós mesmos e nos tornar completos, isso criará mudanças cultural no mundo, e dará um exemplo às gerações mais jovens para que elas possam repensar suas próprias expectativas de vida.

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